BNZ em foco
Lançamento de Novos Modelos Automotivos no Mesmo Ano: Ausência de Violação ao CDC
05/10/2017
Um dos maiores recursos que as fabricantes/montadoras automotivas possuem para estimular a venda de veículos é a colocação no mercado de novos modelos repaginados, com a modificação do design, inserção de novas tecnologias, readequação de mecanismos, atendimento às principais exigências do mercado, entre outras características que tornam o bem mais atrativo e diferenciado dos demais lançados.
Trata-se de estratégia vastamente utilizada e balizada pelos próprios consumidores, que requerem e aguardam novidades do setor automotivo para sua própria satisfação pessoal, seja pela proporção de maior bem-estar, pela curiosidade do experimento do novo ou pela simples concretização do desejo de troca por veículo de modelo mais avançado.
Sabe-se que, costumeiramente, os novos e esperados modelos de veículos são lançados anualmente, gerando a expectativa de troca no mercado, entretanto, não se pode descartar a possibilidade de lançamento de novo modelo em período menor, situação essa que será alvo de breve debate no presente artigo.
O Código de Defesa do Consumidor – CDC –, em seu art. 12, §2º, preceitua que “o produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado”, dando margem à interpretação de que o fato de se efetuar novo lançamento automotivo antes do decurso do período anual não pode ser utilizado como argumento para pedido de troca do produto, pois trata-se de prática mercadológica que estimula a livre iniciativa e a própria concorrência entre as fornecedoras do ramo.
Citada interpretação é estampada em diversos julgados, nos quais se reconhece a ausência de abusividade e a inexistência de qualquer ilícito pelo lançamento de novos modelos automotivos nos moldes acima citados, excluindo-se qualquer responsabilização das fabricantes/montadoras automotivas pela reparação de danos.
A ausência de caracterização da prática abusiva, como frisado alhures, se dá pela observância da boa-fé no desenvolvimento de novas tecnologias, que além de não violar o CDC, por estar em consonância com o art. 4º, é incapaz de causar qualquer lesão ao consumidor adquirente do veículo.
Frisa-se que não há qualquer ilícito, na medida em que além de um produto não ser considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado, deve ser levada em conta a época em que foi colocado em circulação, ou seja, o produto não será considerado “defeituoso” em razão do lançamento de modelo novo, já que novos lançamentos não podem gerar o reconhecimento de que o produto anterior é perigoso ao consumo, tampouco impedem a sua fruição.
Ainda, o produto não perde a qualidade em razão de novo modelo, já que o consumidor pretendeu naquele período adquirir aquele modelo disponível no mercado, ou seja, não se pode falar em “vício de qualidade” no produto anteriormente adquirido, pois esse permanece com as características qualitativas próprias e adequadas ao seu fim, relacionadas à época de sua circulação.
Nesse sentido, vale a pena destacar as palavras proferidas pelo Desembargador Roberval Casemiro Belinati, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, por ocasião do julgamento da Apelação Cível nº 2001.01.1.035821-3, que indicou:
Segundo o artigo 12, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, "o produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado." Assim, o fato de ter sido feito o lançamento de dois modelos de automóveis em um mesmo ano é plenamente aceitável, sendo essa uma prática usual para atrair novos consumidores e para adaptar o novo veículo aos avanços tecnológicos.
Desse modo, a não comunicação da revendedora, no momento da venda do veículo, de que será feito o lançamento de nova versão do veículo, ainda no mesmo ano, não significa propaganda enganosa nem qualquer ofensa ao Código de Defesa do Consumidor, mormente quando o novo lançamento vem sendo anunciado por revistas especializadas.
Por consequência, o consumidor que adquire um veículo em um ano e no mesmo ano vê o lançamento de sua nova versão, não tem o direito de exigir da revendedora a substituição do veículo, pelo mais moderno, e muito menos indenização por danos morais ou patrimoniais, sobretudo quando o automóvel adquirido não apresenta qualquer defeito que o torne impróprio ou inadequado para o uso a que se destina.
(...)
A só colocação no mercado de um veículo novo, remodelado, tal não implica em ofensa aos sentimentos do recorrente, não sendo incomum os fabricantes, as montadoras, deixarem as concessionárias lançarem um modelo novo de veículo havendo um outro, sem que venha a implicar, necessariamente, uma prática “abusiva e enganosa”, porque o mercado já se ajustara a esta prática, uma estratégia de marketing.
Por outro lado, há que se ressaltar ainda a indicação efetuada pelo Desembargador Leonam Gondim da Cruz Junior do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por ocasião do proferimento de seu voto na Apelação Cível nº 2014.04501337-02, ao julgar litígio no qual se discutia a regularidade da “venda de automóvel sem a informação ao comprador quanto a lançamento próximo de novo design”.
O D. Magistrado afirma que “o sigilo alusivo a lançamento de novos modelos de veículos é prática notória no mercado correspondente. Faz parte da dinâmica deste”, tratando-se, portanto, de omissão não caracterizadora de responsabilidade das fabricantes/montadoras automotivas, pelo não fornecimento de informações sobre a novidade automotiva ao consumidor.
Portanto, apesar dos lançamentos de novos modelos de veículos se dar costumeiramente de forma anual, com vistas ao fortalecimento da exploração do ramo automotivo, bons olhares merecem ser direcionados às estratégias antecipatórias e inovadoras como a aqui tratada, para o estímulo ao avanço tecnológico, à competição saudável entre fabricantes/montadoras automotivas e ao aquecimento do mercado, já que tais objetivos encontram guarida na própria Política Nacional das Relações de Consumo, que zela pela necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores, segundo o que dita o art. 4º, inciso III, do CDC.
Paula Dias Cruz
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